sexta-feira, 27 de julho de 2012

Rua das Artes: um MAR de saúde e anarquia



O que torna ou caracteriza o uso do espaço é o seu uso. Intensificar o uso público do espaço é um dos objetivos do MAR de Palhaços. Mas não é somente isso. Nosso objetivo é fortalecer nossa prática de arte de rua que é intrinsecamente pública, com a consciência de que nossa arte, para continuar existindo e se fortalecendo, precisa de espaços públicos bem servidos dos elementos principais que o caracterizam como públicos: as pessoas. 

O poder da arte de rua é de agregar as pessoas, acalentar espíritos, tornar o entretenimento algo realmente importante no sórdido cotidiano produtivista deste sistema em que vivemos. Dizem que vivemos em um estado de democracia e de liberdade, mas a verdade é que uma pequena elite de poderosos vive a democracia entre eles e desfruta da “liberdade” de oprimir através de um sistema de escravidão assalariada. Através de poderosos discursos ideológicos permanentemente introjetados na nossa cultura materialista, algumas “verdades” sobre o ato de fazer arte desconsideram sua importância e relegam-na a algo menor pois afinal, o que a arte produz de fato? Qual bem material a arte produz? Nenhum, efetivamente?

Para nós, do  MAR de Palhaços, a arte pode produzir no mínimo liberdade, saúde e consciência. A capacidade de conexão inter-humana nos faz bater mais forte nosso coração. Expressar-nos ao ar livre nos faz enxergar coisas que dentro de quatro paredes servindo a um patrão ou ao Estado nunca seriam enxergadas. Passamos a pulsar contra os condicionamentos correntes do sistema sobre os seres humanos e a irradiar energia dentro de um fluxo de possibilidades. Somos perigosos para o sistema porque não aceitamos o fato dado, a  realidade como ela é. Acreditamos que podemos modificá-la e acreditem, nosso poder de criatividade já a modifica. Não é revolução, não nos moldes clássicos, mas é anarquia sim! É liberdade ao extremo, mas não a liberdade burguesa. A liberdade que cultivamos é aquela que só aumenta quando aumenta a liberdade do outro, pelo simples fato de que quanto mais livre o outro mais difícil da liberdade acabar. É Hiper-Evolução (não confundir com Hiper-revolução). A Hiper-evolução se faz com micro-revoluções cotidianas e essa é a principal característica do Rua das Artes Encontro de Circo.

No dia 24 de julho de 2012, por exemplo, essa nossa ação adquiriu mais poder nesse sentido. Nosso camarada Ale, o poeta, já viu a galera da Dança de Rua fazendo uma função na sinaleira, já convidou a galera pra aparecer e a galera já deu o ar da graça no nosso encontro. E assim vamos seguindo, formando aqueles que se interessam em adentrar no mundo da arte de rua e agregando aqueles que já a praticam. Fica um desafio para todos nós. Estamos cuidando para que isso se torne sistemático? Que outras micro-revoluções podem ser acessadas através disso? Como podemos fluir para o cotidiano? Não esperamos que nenhuma resposta surja de um líder iluminado pelo farol de seu próprio ego, mas insistimos que esta resposta surja na consciência geral, através de todos nós e que nossa conexão Hiper-Evolucionária mostre que dependemos somente da responsabilidade de cada um e da conexão de todos. 

quinta-feira, 19 de julho de 2012

OLHAR DE PALHAÇO


A cada terça-feira que chega passamos a nos surpreender ainda mais com esse poder humano que acessamos nesta empreitada que tem sido o Rua das Artes Encontro de Circo. Neste dia 17 de julho de 2012 foi muito lindo de ver as atividades acontecendo espontaneamente pela praça do Campo Grande, numa plena terça-feira, dando cor ao espaço e ao tempo, através da união de nossas energias e intentos artísticos. No mínimo houve palco aberto com belíssimas apresentações, recital de poesia, treino de malabarismos diversos, oficina de bastão, oficina de perna-de –pau e a oficina o “Olhar do palhaço”, a partir da qual pretendo refletir aqui sobre o Rua das Artes Encontro de Circo e o MAR de Palhaços.

Há algum tempo a arte do palhaço vem ganhando força em Salvador e os que têm mantido seu intento vivo e inflexível para fortalecer cada vez mais a existência dessa arte, tem também experimentado um prêmio esplêndido. Vivenciar a arte do palhaço é mudar nossa forma de ver o mundo. O olhar do palhaço está repleto de vida, como o olhar de um guerreiro que desafia os ditames da morte. Mais do que isso, nós palhaços aprendemos a enxergar que precisamos desafiar nossos limites, nos entregando a eles, denunciando eles para o mundo, aceitando-nos. O Olhar do palhaço é o olhar de uma paixão, a paixão pela vida, pela existência, pela presença...

Conectar-se com as pessoas através desse olhar muda toda a perspectiva e determinação da construção energética dos sucessivos momentos. Estar presente, inteiro, integral, oferecendo sua alma para que as pessoas possam beber de uma troca humana cheia de espirituosidade e inocência é pura generosidade. Dar do que temos nunca poderá valer mais do que dar do que somos. Estar receptivo e alerta, com atenção a nossos semelhantes é uma ato de coragem inestimável e com certeza gera uma transmutação naqueles que se arriscam a seguir essa vereda.

Mas conectar-se cenicamente não é somente uma ato passageiro de prazer, é um exercício que detona espasmos de consciência cotidiana e uma série de reflexões inevitáveis e profundas sobre nossas relações sociais e como elas vêm se concebendo na contemporaneidade. Como a mesquinhez vem dominando as relações econômicas historicamente e como isso vem afetando o cotidiano das pessoas está materializado na configuração de nossos espaços públicos. A configuração envolve não somente sua estruturação física, mas a dinâmica de seu uso. O Rua das Artes Encontro de Circo vem cumprindo bem, a meu ver, um papel hiperevolucionário de transformar o uso do espaço. Aliás esse é o papel que há muito o MAR de palhaços vem cumprindo há um tempo em Salvador. Transformar o uso do espaço através da criação de uma Zona Autônoma Temporária, de tal maneira que isso marque permanentemente a memória do espaço.


Tem sido muito bom participar do Rua das Artes e, com meu olhar de palhaço poder assistir as pessoas que se entretinham nesta jornada a jornada da construção de um espaço melhor, de uma cidade melhor e de um mundo melhor...e por que não?!!!!!!

Igor Sant'Anna Caxambó

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Rua das Artes: um MAR de Amor


Por Igor Sant'Anna Caxambó 
Cia Pé na Terra - http://www.penaterradospalhacos.blogspot.com.br/
*fotos por Safira Moreira


Nossa razão está condicionada por um sistema escolar que institucionaliza nossa existência material. Somos praticamente obrigados, pela cultura da escolarização, a escolher viver nos moldes criados por outrem, sem refletir, sem sentir e sem ter tempo de desenvolver nossa subjetividade. Os valores disseminados pela institucionalização do saber, a escola e todo seu sistema educacional, nos impõem um modo de vida baseado no consumismo, do ter em detrimento do ser. 




Parece-nos até que essa imposição acontece de maneira sutil, mas não é bem assim. Há um sistema que trabalha através das lacunas da "consciência desatenta", ou seja, estamos desatentos com nós, nosso corpo, nossa emoção, nossa personalidade, nossa individualidade/coletividade. Nossa desatenção conceitualiza essa imposição declarada como sutil, mas não há nada de sutil, a verdade está posta. Precisamos desenvolver nossa subjetividade coletiva, a identidade do nosso tipo de sociedade ou micro-sociedade em que nos instalamos está no caráter dos nossos espaços públicos, na razão e emoção de sua existência.


A arte do palhaço é  arte de enamorar-se da vida. Apaixonar-se pelas pessoas significa deixar que o amor flua através de nós. Alinhar com um estado de consciência em que pese a plena presença, a sensibilidade intuitiva e uma "rebeldia não-revoltosa". Não é um ato de rebeldia mas de abandono. Como abandonar este sistema estando dentro dele? Vivenciá-lo sem cumprir sua cartilha?"Eles" querem que vivamos sem pensar? Antes querem que vivamos sem sentir o que nos é autêntico sentir. Dizem que devemos seguir os caminhos da razão contra os caminhos do coração. Aquele que seguir o caminho de seu coração é considerado um louco! 


Mas quem dita os caminhos da razão?


REflexão: o que é esfera pública na sociedade de hoje? Por exemplo: TElevisão é uma concessão pública, utiliza o ar, assim como o rádio, para transmitir. Na lei é necessário haver uma concessão pública. Nossos (lá deles!!!) políticos concedem este poder de comunicação a interesses privados que focam na sociedade de consumo e corroboram constantemente com uma sabotagem educacional do povo, utilizando o bloqueio do desenvolvimento da racionalidade pertinente à escolarização. 


Voltando à arte do palhaço: ocupar um espaço público, sendo nós mesmos, assumindo o lugar do ridículo, nos relacionando com as pessoas a partir da nossa espontaneidade e do nosso coração, em detrimento das máscaras sócio-comportamentais ditadas pela razão avassaladora, é hiperevolucionário. A realidade na verdadeira realidade não está posta!!! Está sendo postada, constantemente. Adotar a ocupação de um espaço público através da arte, deixando que ela faça a mediação das nossas relações 
sociais é um verdadeiro salto quântico. Rua das Artes Encontro de Circo é este lugar, porém, mantenhamos o pensamento: se esses princípios não se perpetuarem no nosso cotidiano estará sendo postada uma retração do salto quântico.Aí devemos nos voltar para compreender o que significa o MAR de Palhaços.


O Rua das Artes é o lugar que nós, artistas de rua, encontramos para fortalecer nossos afazeres artísticos. É um MAR de água doce que encontramos no meio do deserto. Ele ajuda, estimula, recruta novos guerreiros para arejar um movimento que vem acontecendo cotidianamente cujo princípio é : viver da arte é possível!!


Mas o que é viver da arte? É se alimentar dela, ganhar dinheiro mesmo, mas é só isso? Não, porque não só de pão vivemos não é? Precisamos nos alimentar de nós mesmos, nos retroalimentar com nossos próprios sonhos, nosso autênticos sonhos, partindo de nossas pulsações interiores. Precisamos mesmo mais do que ganhar dinheiro, ganhar a nós mesmos!!!Tivemos nossa infância roubada. Nos afastaram de nós e nos disseram que somos seres racionais porque criaram uma razão de existência artificial para que estejamos constantemente alimentando a um sistema que nos suga e nos faz acreditar que dependemos dele.


Convidamos a tod@s: se integrem, procurem saber, venham somar e multiplicar o MAR de Palhaços. Somos um movimento em plena expansão, de formação, emancipação, libertação, comunhão, amigão, comer pão, também feijão. Comer com fome é bem melhor, 
principalmente quando descobrimos que podemos criar nosso prato, mais do que escolher dentre os velhos cardápios.



Links de referências inspiratórias:


quinta-feira, 5 de julho de 2012

Rua das Artes em 3 de julho de 2012

Por Igor Sant'Anna Caxambó - Cia Pé na Terra www.penaterradospalhacos.blogspot.com


Com grande satisfação o Rua das Artes -Encontro de Circo vem acontecendo de vento em polpa. No dia 3 de julho de 2012 , tivemos uma grande e qualificada quantidade de pessoas, treinando, trocando, se divertindo, exercendo arte, na rua, no espaço público, no Campo Grande. O Rua das Artes é um encontro de circo na rua afim de dinamizar a formação de artistas e companhias que possam integrar ao MAR* de Palhaços (*Movimento Abre-Rodas de Palhaços) que avassala a cidade de Salvador. Para nadar nesse mar é necessário estar conscientemente conectado ao grande propósito do MAR e seguir suas ondas, surfar para o infinito, perpetuando nossa relação com o território, do artista com o território. 


Estamos constantemente sendo desterritorializados (HASBAERT, 2009) por um movimento globalizado que transforma tudo em mercadoria, enfraquece a vida pública e nos impele a uma reorganização constante impelida por diferentes partes integrantes da sociedade. Esse processo que envolve certos conflitos gera uma multiplicidade de interações entre as pessoas no território o que envolve diferentes e diversas relações internas na sociedade e desta com a natureza. Dentro desta interação está o poder político, está também os interesses econômicos, os impactos ambientais...



O que entendo por desterritorialização colocada por Hasbaert é que os grupos humanos estão em constante processo de se territorializar e em certos aspectos isso gera resistência a territorializações que caminham para se hegemonizar. Esses movimentos hegemônicos criam determinadas desterritorializações porém a resistência cotidiana gera novas territorializações...Neste ínterim surge um MAR de Palhaços, um encontro como Rua das Artes, formando uma Zona Autônoma Temporária (Hakim Bey) cujos parâmetros de relações sociais com o espaço são ressignificados. Mas este é um espaço de formação, digamos, de fortalecer nossos espíritos para agir contra a coação sistemática das forças neo-liberais hegemonizadoras, E ENTÃO O QUE ESPERAMOS ALCANÇAR COM ISSO? QUAL O PROPÓSITO VERDADEIRO?



O propósito verdadeiro do Rua das Artes, está na sua raiz: O MAR de Palhaços. Vem fazendo parte deste movimento, por enquanto, dois grupos, a Cia Obcena de Artes e a Cia Pé na Terra. Nós temos estabelecido nosso movimento de arte de rua, com palhaçaria, formando pontos de roda, criando cultura de artista de rua. Se formos pra Europa podemos  ver em alguns países que falta espaço pra tanto artista. Por que aqui essa falta de reconhecimento? Sentimos uma dor profunda ao ver alguns artistas passando necessidade, ou atendendo telefone, ou se integrando a um cargo executivo qualquer porque acha que não se pode viver da arte na cidade de Salvador? E

Existe um Ethos na nossa sociedade brasileira, ou mais especificamente, soteropolitana, de que ser artista é não ser digno, mas nós do MAR dizemos que ser artista é ter qualidade de vida, é obedecer aos impulsos de nossos corações, é não abrir mão da nossa autenticidade, da nossa liberdade de sermos quem somos. É um ato de intento inflexível, de caminhar para um propósito, de sabermos qual é nossa missão nesse planeta adoecido pelas estapafúrdias idiotices humanas. De estabelecermos nossa emancipação diante da ignorância das infinitas possibilidades de re-qualificação das relações sociais e de desenvolvimento humano no território.